Entrevista com Eanes Pereira, professor do curso de ciência da computação da UFCG, a respeito da adoção de técnicas de inteligência emocional para aumento de desempenho pessoal.
Por Marcos Antônio Silva Nascimento
(marcos.nascimento@ccc.ufcg.edu.br)
Dando continuação as entrevistas do ano, o professor do curso de ciência da computação da UFCG, Eanes Pereira, fala a respeito da adoção de técnicas de inteligência emocional.






Grupo PET - Olá Eanes Pereira. Inicialmente, conte-nos um pouco a seu respeito.


Eanes Pereira – Toda a minha formação é em Ciência da Computação. Durante o mestrado trabalhei com pesquisas de áreas que tinham interseção com a psicologia e a neurociência. Um dos projetos em que trabalhei no mestrado tinha como objetivo o reconhecimento de expressões faciais. Nossa pesquisa tomou como base os trabalhos do professor Paul Ekman, que tem como fundamentação a divisão das emoções humanas em 6 categorias básicas, além do estado neutro: felicidade, tristeza, medo, aversão e raiva. O tema do meu mestrado, que também teve interseção com a psicologia e a neurociência, foi em atenção visual. Basicamente, o problema era: como simular o processo atencional humano em software. De modo geral, podemos dizer que há dois tipos de atenção, atenção de baixo para cima (bottom-up) e de cima para baixo (top-down). No mestrado,trabalhei apenas com a atenção de baixo para cima. No doutorado, continuei trabalhando com visão computacional mas em detecção de faces humanas em vídeo. Em paralelo à vida acadêmica, meu interesse sobre o funcionamento da mente humana só aumentava. Porém, não me restringi a estudar os aspectos mentais apenas pela perspectiva ocidental, tenho estudado também algumas teorias filosóficas sobre o funcionamento da mente humana descritos nos textos das tradições orientais como o Yoga e o Budismo. Com o tempo tive contato com pessoas que estavam estudando neurociência computacional. Algumas dessas pessoas foram orientadas pelo meu orientador de mestrado e doutorado. Então, resolvi estudar por conta própria alguns aspectos relacionados à mente humana e como os processos cerebrais e mentais poderiam ser modelados computacionalmente. Após terminar o doutorado e ingressar no DSC resolvi iniciar formalmente pesquisas na área de neurociência computacional e orientar trabalhos nessa área.


Grupo PET – Em quais disciplinas você está lecionando atualmente? Em relação à pesquisa, no que está trabalhando no momento?


Eanes Pereira – Estou lecionando as disciplinas: Cálculo Diferencial e Integral 1 e Matemática Discreta. As pesquisas que estamos trabalhando estão sendo executadas no LVC (Laboratório de Visão Computacional) e são: classificação multimodal (utilizando sinais de EEG, audio, imagens e vídeo) de emoções humanas, reconhecimento indexação e recomendação de imagens em bigdata, reconhecimento de ações humanas em vídeos, agrupamento de mídias digitais no contexto cultural do estado da Paraíba e reconhecimento de eventos em vídeos de trânsito.


Grupo PET – De onde e como surgiu o seu interesse pelo estudo das emoções? E como esses estudos se relacionam com a ciência da computação?


Eanes Pereira – Meu primeiro contato com o estudo das emoções humanas foi durante o projeto com a empresa HP que teve início em 2006. Naquele projeto tínhamos como objetivo classificar expressões faciais, mas durante o estudo da teoria entrei em contato com as teorias relacionadas à emoção humana. Porém, após a finalização do projeto fiquei um tempo sem estudar tais teorias e em 2010 tive a satisfação de ler o livro “Como lidar com emoções destrutivas”. Este livro, na verdade, é o relato de um encontro chamado “Mind and Life” que ocorre há mais de vinte anos e que reúne cientistas de várias áreas do conhecimento ocidental (e.g., psicologia, neurologia, matemática, física, etc) e representantes das tradições orientais para discutirem os avanços no entendimento da mente e como aplicar as descobertas para beneficiar a vida das pessoas. A relação da ciência da computação com o estudo das emoções ocorre de várias formas. A ciência da computação é usada para modelar o cérebro, ou partes dele, e simular seu funcionamento em determinadas situações. Além disso, a ciência da computação busca inspiração em outras áreas do conhecimento humano para gerar soluções para problemas enfrentados pela humanidade. Alguns conceitos da ciência da computação inspirados em biologia, por exemplo, seriam: os algoritmos genéticos e as redes neurais artificiais. Além disso, há algumas áreas relativamente novas que envolvem a computação: a computação afetiva e a neurociência computacional. No meu caso, atualmente o meu interesse seria o reconhecimento das emoções utilizando múltiplos meios de aquisição de informação, a evocação de determinados estados emocionais e a utilização do entendimento adquirido sobre os estados emocionais para beneficiar a vida das pessoas (por exemplo, melhorando seu desempenho pessoal e profissional).


Grupo PET – E o que seria inteligência emocional? Como desenvolvê-la?


Eanes Pereira – Uma palavra-chave que descreve a inteligência emocional é a autoconsciência, que é a capacidade de conhecer-se, de perceber o surgimento de emoções positivas ou negativas e não se deixar levar pelos impulsos. Ou seja, a capacidade de sair dos automatismos e pensar antes de agir. De modo geral, as tradições contemplativas têm desenvolvido, há milênios, técnicas para o desenvolvimento do equilíbrio emocional. O impacto positivo dessas técnicas na vida das pessoas têm sido comprovado repetidamente por pesquisadores de todo o mundo. A técnica mais conhecida no ocidente, especialmente pela influência americana é conhecida em inglês como Mindfulness e em português como atenção plena. Na minha opinião, a popularidade da técnica de atenção plena nos Estados Unidos se deve principalmente devido a influência de mestres como Suzuki Roshi representante da tradição Soto Zen japonesa que foi para a Califórnia na década de 1960 e foi um dos responsáveis pelo Centro Zen de São Francisco. Atualmente, o médico Jon-Kabat Zinn é um dos principais divulgadores da técnica Mindfulness e desenvolveu a terapia de redução do stress baseada em atenção plena. Se pesquisarmos, por exemplo, em sites de artigos científicos como o ScienceDirect veremos muitos se referindo a essa técnica. Outro grupo americano, liderado por Paul Ekman e Alan Wallace tem desenvolvido técnicas para o cultivo do equilíbrio emocional e da atenção e têm demonstrado cientificamente os impactos positivos na saúde das pessoas. Recentemente, Alan Wallace publicou um artigo tendo co-autoria da prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina Elizabeth Blackburn. No referido artigo, eles comprovaram a influência positiva de práticas contemplativas no processo de divisão celular e desgaste dos telômeros. Enfim, dentre as práticas comprovadas cientificamente para cultivo da inteligência emocional eu recomendo as práticas de meditação de atenção plena.


Grupo PET - Quais eram e são suas expectativas com relação à utilização das técnicas de inteligência emocional para aumento do desempenho pessoal, profissional e acadêmico?


Eanes Pereira – Inicialmente, eu não dava muito crédito para as técnicas, mas após ver muitos relatos positivos, decidi praticar e verificar os resultados. Após participar de vários cursos, com representantes das áreas ocidental e oriental para cultivo da atenção e do equilíbrio emocional e tendo praticado durante vários anos eu diria que a minha vida melhorou bastante em todos os aspectos. Como um relato pessoal é algo muito subjetivo e carente de confiabilidade estatística eu diria que qualquer um dos queridos leitores poderia fazer uma busca rápida em sites de periódicos científicos e verificar por si mesmos a imensa quantidade de pesquisas que tem comprovado o impacto positivo de tais práticas nas vidas das pessoas. Eu sugiro que qualquer pessoa que tenha curiosidade sobre tal tema deixe de lado o receio, pratique e veja o resultado. Porém, como um remédio, nem toda técnica serve para todo mundo. Vale a pena testar.


Grupo PET – Existem trabalhos sobre aplicação dessas técnicas para melhorar o desempenho de alunos universitários? Quais os resultados?


Eanes Pereira – Há vários trabalhos na literatura científica das áreas de educação e psicologia sobre o uso de técnicas para equilíbrio emocional, aumento da atenção, melhoria da memória de trabalho, etc. Um problema bastante estudado é a ansiedade em dias de exames de matemática e como lidar com eles. Os resultados são animadores, alguns estudos mostram que a simples prática de observar atentamente o fluxo respiratório pode reduzir bastante o nervosismo de estudantes.


Grupo PET – Fale um pouco do projeto de tutoria baseada em técnicas de inteligência emocional que está sendo proposta para os alunos do nosso curso? Quem pode participar?


Eanes Pereira – Este projeto de tutoria surgiu de um questionamento pessoal que eu tinha há muitos anos e nunca tinha tido oportunidade de investigar: o alto índice de reprovação de estudantes na disciplina de Cálculo. Como estou tendo a oportunidade de lecionar esta disciplina, resolvi aproveitar a oportunidade para investigar o problema. Como alguns alunos se mostraram interessados e em algum momento eu tive a oportunidade de conversar sobre isso com a professora Lívia (Coordenadora do PET) e com o professor Leandro (Coordenador do curso) surgiu a ideia de auxiliarmos os alunos que estão entrando no curso ensinando-lhes técnicas de estudo e de cultivo da atenção e do equilíbrio emocional. Inicialmente, pretendemos trabalhar com alunos que estão entrando no curso para desde o início auxiliá-los na geração de bons hábitos. Como temos um número restrito de alunos que irão ser tutores, iremos selecionar uma quantidade de alunos que não sobrecarregue os alunos tutores.


Grupo PET – Gostaria de acrescentar algo mais a respeito das técnicas de inteligência emocional e do projeto de tutoria?


Eanes Pereira – Sobre o projeto de tutoria, esta primeira fase servirá para desenvolvermos a metodologia e testarmos ideias. Posteriormente, pretendemos continuar aplicando a metodologia aprimorada, analisar os dados coletados e modelar computacionalmente os perfis dos estudantes e quem sabe criar guias de recomendação para alunos que desejam ter um bom desempenho na universidade.


Grupo PET – Eanes Pereira, obrigado pela entrevista.


Eanes Torres – Muito obrigado ao PET Computação pela oportunidade de expor minhas ideias e pela colaboração neste projeto de tutoria.


Se você tiver gostado, compartilhe com seus amigos! Não se esqueça também de curtir e compartilhar nossa página no Facebook


Jornal PETNews - Edição: Rafael Rêgo e Abner Araújo- Revisão: Lívia Sampaio e Gleyser Guimarães
Grupo PET Computação UFCG, 2013. All rights reserved.