Computação UFCG na Índia
Por Savyo Nóbrega
(savyo.santos@ccc.ufcg.edu.br)
Na entrevista deste mês, o aluno Solon Aguiar conta como foi a sua experiência na Índia, onde participou de um treinamento para a empresa ThoughtWorks.




Grupo PET - Olá Solon, fale um pouco sobre você.

Solon Aguiar.

Solon - Oi! Meu nome é Solon Aguiar, tenho 22 anos e sou natural de Campina Grande mesmo, tendo sido criado a maior parte do tempo lá (hoje moro em Porto Alegre). Quando eu tinha 10~11 anos, morei oito meses nos Estados Unidos, porque minha mãe foi lá para trabalhar, então aproveitou para me levar.

Acredito que o maior motivo para eu ter escolhido o curso de Ciência de Computação foi a minha irmã do meio (Glaucimar Aguiar - que foi do PET!). Ela fez graduação e mestrado em Computação na UFCG também. Daí, mesmo sem querer, me influenciou. Desde quando eu tinha meus 10~12 anos eu a via mexendo com o computador e brigando com os muitos livros de cálculo. Quando fui ficando um pouco mais velho (e ela já trabalhava) comecei a ver todas as viagens que ela fazia e os lugares legais que ia.

Além disso, um pouco mais tarde (pelos 16) comecei a conversar com ela e saber mais detalhes de como era a vida de um profissional da área. Achei bem mais interessante que a da minha outra irmã (que fez medicina). Como sempre gostei da área de exatas, no fim das contas, na hora de marcar o curso na inscrição do vestibular, resolvi escolher Computação (fiquei na dúvida com Engenharia Elétrica). Hoje, tenho certeza de que tomei uma ótima decisão!

Grupo PET - Como surgiu o interesse em trabalhar numa empresa?

Solon - Durante a graduação, eu tive a oportunidade de experimentar várias áreas de estudo. Procurei seguir o conselho que o professor Tiago Massoni deu aqui mesmo no PETNews logo quando ele entrou no curso (na matéria de entrevista). Ele falou que cada um deveria experimentar a maior gama de áreas de estudo possível, porque a graduação era o momento disso, de forma que, só assim, cada um saberia aquilo que mais gosta.

Seguindo a ideia dele (já sabem com quem reclamar se tiver algum problema!), fui bolsista por alguns meses no LSD trabalhando no projeto do OurGrid. Esse era um projeto de P&D, mas meu trabalho era voltado a desenvolvimento (era só o segundo período, então eu sabia pouca coisa). Depois, fui voluntário no extinto GMF ajudando no mestrado de Jemerson Damásio. Nesse período, foi o momento que comecei a ter mais contato com pesquisa em computação, porém saí logo de lá. Em seguida, o professor Rohit me convidou para iniciar um projeto do PIBIC. Aceitei de cara! Nesse ano (e no seguinte - passei um ano e meio trabalhando com ele) eu tive mais contato com o mundo das pesquisas; tive a chance de fazer algumas viagens e conhecer pessoas muito inteligentes.

Mais perto do fim da graduação, eu fiz estágio na Smartiks (queria 10 créditos da disciplina e conhecer o ambiente de uma empresa - era uma área que eu não tinha explorado ainda). Foi uma época muito legal, em que meu trabalho era focado em desenvolvimento de sistemas para a CHESF. Conheci um ambiente diferente e que, ao mesmo tempo, me empolgava e desafiava. Logo depois do estágio, eu fui contratado como funcionário efetivo.

Como eu disse, tive a chance de embarcar em várias empreitadas durante o curso. Cada uma delas foi muito proveitosa, de sua maneira particular, e eu aprendi muitas coisas diferentes. Acredito que consegui colher frutos de cada uma. Em relação a meu trabalho atual, ainda enquanto eu fazia o estágio eu fiquei sabendo que a ThoughtWorks estava contratando. Então, me inscrevi e fiz todo o processo. Fui aprovado e naquele momento achei que seria um desafio muito legal a topar. Sabia que teria que abrir mão de muitas coisas, por esse motivo ponderei bastante, mas resolvi aceitar e, depois de algum tempo (tive que terminar o curso ainda), fui contratado pra valer. A partir daí, começou a acontecer uma avalanche de coisas.

Grupo PET - Como se deu o processo de seleção?

Solon - Normalmente, o processo de seleção é bastante longo. Pode durar de um mês até dois. O meu caso foi um pouco diferente. Algumas vezes no ano a ThoughtWorks faz eventos chamados BootCamps. Esses geralmente ocorrem em um final de semana em alguma cidade escolhida. Felizmente, nessa época o evento iria acontecer em João Pessoa. Como era próximo, me inscrevi.

Nesses eventos, primeiro você se inscreve pelo site (preenche um formulário online e manda o CV). Depois de alguns dias, se for do interesse deles, eles te ligam e marcam para você participar do evento. A partir daí, começa o processo. Você é submetido a uma série de testes e entrevistas que buscam lhe avaliar em todos os sentidos (só para ter uma ideia, ver aqui). Fazer seleção em um BootCamp é bastante cansativo, porque se faz todo o processo em apenas um final de semana (aquele sábado e domingo foram muito corridos!), mas, em compensação, não tem a espera de dois meses. Quem faz o processo normal (sem ser nesses eventos) faz a mesma coisa, porém com um espaço grande de tempo entre cada teste/entrevista.

Grupo PET - Qual foi a duração desse treinamento?

Solon - O treinamento que fiz na Índia durou seis semanas. É um treinamento voltado não só para a parte técnica, mas uma forma de imersão na cultura da empresa. A ThoughtWorks tem uma cultura e valores pelos quais preza bastante, então uma parte desse tempo é dedicada a nos introduzir a tais ideias e conhecer nossas opiniões sobre tudo.

Em relação à parte técnica, o treinamento busca familiarizar todos com o funcionamento diário de um projeto da empresa (nós trabalhamos em um projeto de verdade que é sediado em um dos escritórios da Índia); práticas ágeis utilizadas; contato com o time e o cliente etc.

ThoughtWorks - Bangalore, Índia.

Grupo PET - Fale mais sobre o seu dia-a-dia no país asiático.

Solon - Uma das coisas que se aprende na ThoughtWorks é que não há rotina :-) Tem gente que até reclama da falta de rotina, mas para efeito de explicação posso fazer um resumo dos pontos do meu dia-a-dia.

Nós tínhamos que estar no escritório todo dia às 8 h para começar a trabalhar às 9 h (antes era servido o café da manhã). Para isso, a empresa disponibilizava dois ônibus. Eles nos levavam e nos traziam. Chegando lá, nós tomávamos café da manhã (quem quisesse podia tomar em casa) e íamos para os nossos projetos (o pessoal era dividido em quatro diferentes times).

Cada projeto tinha a sua própria organização. A organização do meu foi definida por nós mesmos (os grads, como éramos chamados. Além dos "alunos", cada projeto tinha os coaches que são funcionários da TW do mundo todo que também vão para a Índia para servir de guias e professores). Tínhamos uma standup às 9h15min na qual decidíamos que tarefas seriam alocadas para cada par (durante o desenvolvimento de qualquer produto, a ThoughtWorks adota Pair Programming). Dependendo do dia, tínhamos outros tipos de reuniões (IPM, Retrospectives ou Showcase), mas essas eram apenas uma vez na semana.

Bangalore, Índia.

Grupo PET - Onde você morou/se hospedou nesse tempo? Como era o seu custo de vida lá?

Solon - Todo mundo (já que não foi apenas gente do Brasil, mas grads de todos os escritórios do mundo inteiro) ficava em um condomínio chamado Diamond District. Lá, éramos divididos em apartamentos com outras duas ou três pessoas. Elas que seriam os roomates durante as seis semanas de curso. Eu dividi apartamento com um cara da China e outro dos Estados Unidos.

Os apartamentos eram bem grandes e completos (o meu tinha 2 andares e 4 quartos) com serviço de limpeza, internet, comida, esportes, academia etc. O condomínio é bastante conhecido na Índia por receber gente do mundo todo. Além do pessoal da TW, pessoas de outras grandes empresas também ficam hospedadas lá, então sempre é possível encontrar gente de lugares diferentes para conversar.

Com relação ao custo de vida, viver na Índia com o salário de outro país é muito tranquilo. Especialmente, para os brasileiros, tudo é muito barato. Alimentação, transporte, vestuário é tudo muito barato comparado com os custos daqui. Não tive problemas quanto a isso.

Grupo PET - O que você mais gostou da Índia? Alguma curiosidade ou momento engraçado de lá?

Solon - Ah... Eu gostei de muita coisa! Fica até difícil enumerar. Algumas coisas são mais relacionadas à Índia mesmo e outras ao programa. Como primeiro ponto, eu citaria o povo indiano. Eles são muito atenciosos e de boa índole. Estão sempre dispostos a te ajudar da melhor maneira possível. São um povo muito calmo e que respeita bastante os outros. Obviamente, existem problemas (como em todo lugar), mas a maneira de lidar com eles é totalmente diferente do que eu estava acostumado. A diversidade cultural também é impressionante. Um país com uma civilização milenar, que tem 1542 idiomas oficiais, inúmeras religiões e cultos, tem muita coisa para mostrar.

A experiência de juntar gente de vários lugares do mundo em um único curso também é ímpar. Em alguns momentos, parávamos para analisar e notávamos coisas engraçadas. Certa noite, estávamos indo para um shopping e no elevador tinha: dois ingleses; um americano; um indonésio; um indiano; um brasileiro; um chinês e um alemão! E isso era o cotidiano normal da gente. Todos no mesmo curso! Pessoas de todos os lugares convivendo junto e trocando ideias. Isso é uma oportunidade muito rara.

Experiências engraçadas são muitas também. Tive a chance de andar nos tuktuk com outras quatro pessoas no meio do trânsito caótico (normalmente andam apenas três pessoas). O trânsito lá é muito diferente daqui. É muito mais barulhento e cheio, então andar naquele tuktuk pequenininho no meio dos ônibus e caminhões exige coragem na primeira vez, depois se acostuma. Outra experiência que não vou esquecer é com a comida, claro. Para nossos padrões, a comida é MUITO apimentada. Nos primeiros dias, eu não sabia disso (apesar de já ter escutado isso, achava que não era nada demais, então fui achando que conseguiria lidar sem problemas - e também queria testar, afinal era a chance), daí queimei a língua algumas vezes (depois de alguns litros de água e sorvete consegui minimizar o efeito).

Passeio no tuktuk.

Grupo PET - Solon, o que você achou dessa experiência e o que ela contribuiu para a sua formação pessoal e profissional?

Solon - Uma experiência sem igual. Recomendaria a todos que tivessem a chance de ir, não hesitar. Como eu já falei, é algo que marca pela vida toda. Fiz amizades que carrego até hoje e acredito que vou carregar por muito tempo. Todas as horas do dia recebo mensagens no celular dos quatros cantos do mundo (tenho que desligar a internet à noite para conseguir dormir, porque o pessoal que mora na Austrália, por exemplo, fica falando e eu recebendo notificações).

No âmbito profissional, diria que o programa ajudou muito no processo de imersão à cultura e práticas da empresa; às práticas ágeis no dia-a-dia de um projeto; como lidar com os clientes, com times grandes e equipes distribuídas geograficamente (nosso cliente ficava em outro país com fuso horário diferente). Vale muito a pena.

Grupo PET - Que conselhos você daria para os interessados em seguir esse caminho?

Solon - Os conselhos, por mais clichê que sejam, são os de sempre. Primeiro é ir atrás. Existem muitas oportunidades por aí, basta ir atrás e não desistir. Os processos podem parecer demorados, difíceis e até injustos, mas não se pode desistir na primeira resposta negativa. É muito ruim receber um "não", mas faz parte da caminhada de qualquer um.

Se não der certo, tente novamente. Batalhe, estude, se esforce. As coisas não acontecem sem algum sacrifício, então faça sua parte também. Converse com outras pessoas, faça contatos, tire dúvidas, faça perguntas, experimente e, principalmente, não tenha medo. Não tenha medo diante das dificuldades, incertezas, do novo. É muito fácil ficar na zona de conforto e se conformar com o fácil. Se desafie. Busque aquilo que você quer. Acredite!

Grupo PET - Solon, muito obrigado por nos conceder esta entrevista.

Solon - Valeu pelo convite! Eu que sempre lia o PETNews agora estou aqui. Muito legal. Se alguém tiver mais alguma questão, pode entrar em contato. Posso até demorar a responder, mas respondo.

Jornal PETNews - Edição: Jeymisson Oliveira - Revisão: Iago Araújo e Joseana Fechine
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